Uma vez... faz, sei lá, uns 3 anos, conheci um garoto que se chamava Giovanni. Ele devia ter a minha idade - não lembro de ter perguntado – e morava na Itália. Conheci ele lá mesmo, quando viajei para Europa. Foi logo no primeiro dia em que cheguei.
Fui jantar em um restaurante tradicional deles, para ver se os caras mandavam bem mesmo na culinária e pedi logo um X-salada bacon. É obvio que não foi isso que eu pedi, porque eu estava na porcaria da Itália e o X-salada bacon não é um dos pratos mais tradicionais de lá, você sabe. Na verdade fiquei sentado na mesa um tempão tentando entender o cardápio e um pouco em dúvida sobre o que eu deveria pedir. Acho que não estava com tanta fome assim.
Era um desses restaurantes pequenos e barulhentos onde todo mundo consegue escutar a conversa de todo mundo e por isso acaba não entendendo ninguém. Aí, chegou esse cara, sentou na mesinha do lado, encostada na parede. Percebi que já era freguês antigo. Cumprimentou os garçons sem constrangimento, mas assustou todo mundo quando pediu o cardápio.
Foi um troço engraçado de se ver. Ele levantou o braço e pediu. O garçom mais próximo olhou pra ele com uma expressão meio descrente, entre um sorriso e um assombro. E eu não estava entendendo nada. Vi o garçom indo até o balcão e comentando algo com dois colegas. Os dois sorriram, curiosos, e olharam para o cliente. Ele, por sua vez, estava tranquilo, desenhando alguma coisa no guardanapo descartável.
Acabou pedindo uma lasanha qualquer, mas o que me chamou atenção mesmo foi um chaveiro que ele tinha com a bandeira do Brasil. Aquilo me animou muito. Porque, tudo bem que existem milhões e milhões de brasileiros aqui no Brasil e a gente não fica muito animado todos os dias por causa disso, mas quando encontramos algum na Itália, puxa, é muita coisa em comum, não é verdade?
Eu já estava sentado bem próximo a ele, então arrisquei um português e o cara também ficou bem feliz em me conhecer. Um brinde aos brasileiros! Um brinde ao encontro despretensioso dos brasileiros em países estrangeiros! Tipo, o cara podia ser um corinthiano petista, mas puxa, que felicidade de estar com ele ali!
Ele me convidou para sentar em sua mesa e logo vi o que estava desenhando. Era a porcaria de um carro esportivo, feito num giz vermelho vagabundo, mas um troço bem profissional mesmo. Fiquei impressionado com o negócio e ele me contou que trabalhava com isso. Era designer. Estava na Itália há dois anos. Foi para estudar e acabou ficando por lá. Disse que, no começo, achava a qualidade de vida melhor e tudo, mas que depois de um tempo não sabia mais o que “qualidade de vida” significava. Afinal, ele podia andar pelas ruas sem medo de ser assaltado, mas quando chegava em casa não encontrava a família, nem a namorada e nem os antigos amigos.
Me contou que, desde a primeira semana em que chegou, começou a frequentar aquele restaurante, todas as quartas feiras, e que sempre pedia Rondelli de presunto e queijo. Há dois anos comia Rondelli de presunto e queijo todas as quartas feiras. Hahahaha. Eu achei aquilo muito engraçado. Na verdade, quando ele me contou isso eu estava tomando Coca-cola e saiu tudo pelo meu nariz. Precisei de uns cinco minutos para me recuperar porque, nossa, o filho da mãe comeu em dois anos mais rondelli que a porcaria do Jô Soares em toda a sua vida. Mas então ele me explicou que isso o fazia lembrar do Brasil. Não me pergunte o porquê, porque eu não perguntei. Aliás ele entrou numa brisa nervosa nesse momento, talvez pensando no que deixou para trás. De qualquer forma, foi por isso que os garçons acharam estranho quando ele pediu o cardápio.
Ele me contou muitas coisas mais, sobre como seus familiares e amigos ficaram tristes com sua partida e morreram.
Mas isso era coisa do passado. Agora Giovanni (que era como ele se chamava) era um novo homem e, para provar isso, tinha parado de pedir Rondellis. Tinha decidido abandonar essa nostalgia de uma vez por todas, mas acabou nem tocando na lasanha que pediu.
De qualquer forma, por estarmos na Itália e o nome dele ser Giovanni, acabei apelidando-o de Babbo, em homenagem àquele restaurante italiano que fica no Brasil (haha). Nos despedimos com um abraço e voltamos cada um para sua vida. Acabei nunca mais encontrando o infeliz, mas acredito que ele continua sentindo falta do Brasil e provavelmente voltou a comer seus Rondellis.
Essa é uma história fictícia, com o objetivo de passar uma mensagem. Lucca, você entendeu a mensagem. Abs.
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