Fui até ele.
- O que você tá lendo? – perguntei, dando um leve chute na capa. Ele tirou o fone do ouvido direito e sorriu, como se já antecipasse o restante do diálogo.
- John Green. – respondeu.
Falou isso, o cretino. O autor que culpa as estrelas, contradizendo Shakespeare.
Fiz uma careta.
- John Green? De novo? Você já não leu esse livro?
- É outro – respondeu. Mantinha o mesmo sorriso infantil.
Eu ri, sarcástico.
- Você virou fã desse cara?
- Não sei, acho que sim. Já li uns três livros dele. São divertidos.
Ri novamente.
- Isso aí é pra adolescentes apaixonadas cara. Sai dessa. – debochei. – vá ler o Crime e Castigo que eu te dei e que está juntando pó na sua estante. – Aí foi a vez dele de rir. Se arrastou para a esquerda, dando espaço para eu sentar. E foi isso que eu fiz.
- Eu não sou advogado do John Green – respondeu. – mas não acho que seja para garotas. Sei lá. Já li coisas piores.
- Tipo? – perguntei, para implicar com ele. Era um hobbie.
- O seu blog. – finalizou. E digo “finalizou” no sentido oficial do Jiu Jitsu.
Eu ri e ele riu também.
- Não vou nem te perguntar o que você está ouvindo. – falei. Mas ele disse mesmo assim.
- Andrea Bocelli.
Era infernal. O cara lendo John Green e ouvindo ópera.
Mas logo senti novamente uma pontada. Um troço que estava me incomodando há alguns dias. Era uma antecipação infeliz que eu estava fazendo e com a qual eu não conseguia lidar muito bem.
Meu irmão ia casar. Na verdade, ele ia casar, sair de casa e morar em outro estado. E isso era uma verdadeira porcaria. Me chateava mais do que eu gostaria de admitir. Lembro bem do meu pai querendo proibir ele de namorar a menina só pelo medo de acontecer justamente isso.
- Que cara é essa? – perguntou. Ele lê mentes, o infeliz.
- Quê? – perguntei. Para ganhar tempo, acho.
- Que cara é essa? Está bravo? Que foi que houve? – fechou o livro e tirou os fones do ouvido.
- Não Leo, não aconteceu nada. Não viaja. – respondi. Mas ele ficou me olhando com uma cara engraçada, os olhos meio fechados, como se estivesse tentando olhar dentro do meu cérebro ou segurando um espirro feroz. Acabei não resistindo àquele olhar constipado.
- É só que, não sei explicar. Você está indo embora, mas ainda não foi...
- Isso é bem grosseiro da sua parte. – interrompeu, brincando.
- Cala a boca – falei – Me deixa terminar de falar. Você ainda não foi embora, está aqui, mas eu não consigo aproveitar esse tempo da forma que devia. Sei lá. Acho que daqui uns três meses, quando você estiver longe, vou viver pensando “devia ter aproveitado mais a companhia do meu irmão” só que não sei como fazer um troço desses. Aliás, não dá pra fazer um troço desses. É simplesmente utópico.
Ele concordou com a cabeça.
- É frustrante isso. – continuei – estou fadado a viver em um arrependimento estúpido e mentiroso. Tipo, simplesmente não dá pra aproveitar realmente. Você está aqui, como sempre esteve. Na minha cabeça você vai continuar aqui sempre, encostado aí nessa porcaria de árvore por toda eternidade.
- Eu adoro essa árvore.
- Enfim, trata-se de um dilema infernal e idiota. Eu gostaria de não estar tão fixado nisso. Mas estou.
Ficamos em silêncio um tempo. Eu, olhando para o chão, com pernas esticadas e arrancando pedaços de grama com as mãos e ele.. Bom, não sei como ele estava, pq eu estava olhando para o chão e tudo. Mas acho que ele estava olhando através de mim, refletindo sobre aquilo tudo, como sempre faz.
O "Con te partiro" do Andrea Bocelli começou a ficar audível nos fones, por causa do silêncio, e ele pausou a música.
- Não tem jeito, irmão. - ele falou, por fim. - vai ser exatamente isso. Daqui há uns meses a gente vai estar arrependido de não ter aproveitado melhor. Vamos ter ideias do que deveríamos ter feito, como verdadeiros profetas do passado e é capaz de lembrarmos dessa conversa como os "bons tempos". O cérebro é um troço louco.
Respirei. Não estava muito deprimido nem nada. Estava só num "Domingo à noite", que era como a gente chamava os momentos em que sentíamos que alguma coisa estava muito errada, mas não sabíamos explicar o porquê.
- Não está afim de ir no cinema, ou algo assim? - perguntei.
Ele pensou e negou:
- Não dá, cara. Hoje tenho aula de inglês e amanhã vamos sair em casal com o Bruno e a Jessica. Desculpe. Quem sabe na semana que vem?
Olhei para ele, não tão triste com a recusa, poderia aproveitar a noite de muitas formas.
- Sem problemas. Semana que vem nós vamos.
Mas acabamos não indo. E eu me arrependo, claro.
- O que você tá lendo? – perguntei, dando um leve chute na capa. Ele tirou o fone do ouvido direito e sorriu, como se já antecipasse o restante do diálogo.
- John Green. – respondeu.
Falou isso, o cretino. O autor que culpa as estrelas, contradizendo Shakespeare.
Fiz uma careta.
- John Green? De novo? Você já não leu esse livro?
- É outro – respondeu. Mantinha o mesmo sorriso infantil.
Eu ri, sarcástico.
- Você virou fã desse cara?
- Não sei, acho que sim. Já li uns três livros dele. São divertidos.
Ri novamente.
- Isso aí é pra adolescentes apaixonadas cara. Sai dessa. – debochei. – vá ler o Crime e Castigo que eu te dei e que está juntando pó na sua estante. – Aí foi a vez dele de rir. Se arrastou para a esquerda, dando espaço para eu sentar. E foi isso que eu fiz.
- Eu não sou advogado do John Green – respondeu. – mas não acho que seja para garotas. Sei lá. Já li coisas piores.
- Tipo? – perguntei, para implicar com ele. Era um hobbie.
- O seu blog. – finalizou. E digo “finalizou” no sentido oficial do Jiu Jitsu.
Eu ri e ele riu também.
- Não vou nem te perguntar o que você está ouvindo. – falei. Mas ele disse mesmo assim.
- Andrea Bocelli.
Era infernal. O cara lendo John Green e ouvindo ópera.
Mas logo senti novamente uma pontada. Um troço que estava me incomodando há alguns dias. Era uma antecipação infeliz que eu estava fazendo e com a qual eu não conseguia lidar muito bem.
Meu irmão ia casar. Na verdade, ele ia casar, sair de casa e morar em outro estado. E isso era uma verdadeira porcaria. Me chateava mais do que eu gostaria de admitir. Lembro bem do meu pai querendo proibir ele de namorar a menina só pelo medo de acontecer justamente isso.
- Que cara é essa? – perguntou. Ele lê mentes, o infeliz.
- Quê? – perguntei. Para ganhar tempo, acho.
- Que cara é essa? Está bravo? Que foi que houve? – fechou o livro e tirou os fones do ouvido.
- Não Leo, não aconteceu nada. Não viaja. – respondi. Mas ele ficou me olhando com uma cara engraçada, os olhos meio fechados, como se estivesse tentando olhar dentro do meu cérebro ou segurando um espirro feroz. Acabei não resistindo àquele olhar constipado.
- É só que, não sei explicar. Você está indo embora, mas ainda não foi...
- Isso é bem grosseiro da sua parte. – interrompeu, brincando.
- Cala a boca – falei – Me deixa terminar de falar. Você ainda não foi embora, está aqui, mas eu não consigo aproveitar esse tempo da forma que devia. Sei lá. Acho que daqui uns três meses, quando você estiver longe, vou viver pensando “devia ter aproveitado mais a companhia do meu irmão” só que não sei como fazer um troço desses. Aliás, não dá pra fazer um troço desses. É simplesmente utópico.
Ele concordou com a cabeça.
- É frustrante isso. – continuei – estou fadado a viver em um arrependimento estúpido e mentiroso. Tipo, simplesmente não dá pra aproveitar realmente. Você está aqui, como sempre esteve. Na minha cabeça você vai continuar aqui sempre, encostado aí nessa porcaria de árvore por toda eternidade.
- Eu adoro essa árvore.
- Enfim, trata-se de um dilema infernal e idiota. Eu gostaria de não estar tão fixado nisso. Mas estou.
Ficamos em silêncio um tempo. Eu, olhando para o chão, com pernas esticadas e arrancando pedaços de grama com as mãos e ele.. Bom, não sei como ele estava, pq eu estava olhando para o chão e tudo. Mas acho que ele estava olhando através de mim, refletindo sobre aquilo tudo, como sempre faz.
O "Con te partiro" do Andrea Bocelli começou a ficar audível nos fones, por causa do silêncio, e ele pausou a música.
- Não tem jeito, irmão. - ele falou, por fim. - vai ser exatamente isso. Daqui há uns meses a gente vai estar arrependido de não ter aproveitado melhor. Vamos ter ideias do que deveríamos ter feito, como verdadeiros profetas do passado e é capaz de lembrarmos dessa conversa como os "bons tempos". O cérebro é um troço louco.
Respirei. Não estava muito deprimido nem nada. Estava só num "Domingo à noite", que era como a gente chamava os momentos em que sentíamos que alguma coisa estava muito errada, mas não sabíamos explicar o porquê.
- Não está afim de ir no cinema, ou algo assim? - perguntei.
Ele pensou e negou:
- Não dá, cara. Hoje tenho aula de inglês e amanhã vamos sair em casal com o Bruno e a Jessica. Desculpe. Quem sabe na semana que vem?
Olhei para ele, não tão triste com a recusa, poderia aproveitar a noite de muitas formas.
- Sem problemas. Semana que vem nós vamos.
Mas acabamos não indo. E eu me arrependo, claro.
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